Mutação silenciosa explica domesticação do pepino

Estudo revela como alteração genética sem mudança de proteína altera conformação de RNA e regula tamanho do fruto

02.07.2025 | 14:39 (UTC -3)
Revista Cultivar

Uma mutação sinônima no gene ACS2, que codifica uma enzima-chave na síntese de etileno, está na origem da domesticação do pepino (Cucumis sativus). Pesquisadores identificaram que a substituição de uma citosina por uma timina na posição 1287 do gene não altera a proteína resultante, mas modifica profundamente sua expressão. Essa alteração afeta a adição de grupamentos metil (m6A) ao RNA mensageiro, o que por sua vez muda a conformação do RNA e sua eficiência de tradução.

Em pepinos silvestres, a presença da base C no nucleotádeo 1287 favorece a metilação de adeninas vizinhas no RNA. Essa modificação epitranscriptômica cria uma estrutura de RNA mais frouxa, facilitando a leitura pelo ribossomo e resultando em maior produção da enzima ACS2. Como consequência, os frutos crescem menos, pois o etileno inibe a divisão celular.

Nos cultivares modernos, a substituição por T impede essa metilação. A estrutura do RNA torna-se mais compacta, o que dificulta a tradução e reduz a produção da enzima. O resultado é um fruto mais longo, característica selecionada durante a domesticação.

Interação epistática

O gene ACS2 interage com outro gene, YTH1, que codifica uma proteína leitora de m6A. Em pepinos silvestres, a proteína YTH1 reconhece os locais metilados e estabiliza as regiões de RNA mais acessíveis. Isso potencializa a produção da ACS2. Uma mutação no códon de início de YTH1 em cultivares reduz sua atividade, o que diminui esse efeito.

Experimentos genéticos demonstraram que a variante com T em ACS2 é epistática e recessiva em relação à mutação de YTH1: quando a mutação em ACS2 está presente, o estado do gene YTH1 pouco influencia o fenótipo do fruto. Essa interação sugere que a mutação sinônima tem papel central no processo de domesticação.

Impacto na estrutura do RNA e eficiência de tradução

A análise estrutural revelou que a mudança de C para T torna o RNA mais compacto, o que eleva a energia necessária para sua abertura pelo ribossomo. Isso reduz a eficiência de tradução do RNA em proteína. Dados de perfis de ribossomos confirmaram menor ocupação do RNA com a mutação T.

Simulações estruturais indicaram que a conformação do RNA com C é mais diversa e inclui formas mais abertas, favorecendo a interação com YTH1. A mutação T leva à prevalência de conformações mais estáveis e fechadas, que dificultam a leitura.

Consequências para o melhoramento genético

A descoberta destaca a importância de mutações sinônimas na evolução e domesticação de plantas. Mostra também como pequenas mudanças no DNA, mesmo sem alterar proteínas, podem ter grandes efeitos fenotípicos ao influenciar regulações epitranscriptômicas.

O uso de ferramentas de edição genética permitiu reproduzir a mutação T e confirmar seu efeito sobre o fenótipo do fruto. Isso abre caminho para aplicações no melhoramento de culturas por meio da engenharia de expressão gênica em nível de RNA.

Outras informações em doi.org/10.1016/j.cell.2025.06.007

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